23.5.08
8.5.08
A crise de Deus
“A crise que atravessa o cristianismo europeu não é principalmente nem exclusivamente uma crise eclesial… A crise converteu-se numa crise de Deus. E, enquanto tal, deixa de ser provincial ou confessional. Não afecta apenas as igrejas, não afecta só os cristãos, nem sequer apenas os europeus. Trata-se de uma crise da humanidade, pois Deus, ou é um tema que afecta a humanidade inteira ou carece, por completo, de interesse…
Esta crise de Deus não é fácil de diagnosticar, porque na actualidade, tanto dentro como fora do cristianismo, encontra-se envolvida numa atmosfera de positiva predisposição para a religião. Vivemos numa espécie de crise de Deus com cores religiosas. O slogan reza: «religião sim; Deus não!», ainda que este «não» não possua o carácter categórico próprio dos grandes ateísmos. Já não existem grandes ateísmos. Na época da crise de Deus, até o ateísmo se tornou banal. A disputa sobre a transcendência parece concluída; e o além, está definitivamente dissipado. E assim, o ateísmo de hoje pode voltar a falar de Deus – de forma distraída e informal – sem em realidade se referir a Ele: como metáfora flutuante, que se usa nas conversas das festas, no sofá do psicanalista, no discurso estético, ou como código para a legitimação da comunidade jurídica civil, etc.
A religião como nome para o sonho de felicidade sem sofrimento, como encantamento mítico da alma, como presunção psicológico-estética de inocência para o ser humano: sim. Mas Deus, o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob, o Deus de Jesus?...
Até que ponto é compatível com a modernidade o discurso bíblico sobre Deus? Em que condições sobreviveu a todas a privatizações e funcionalizações da modernidade? E à transformação da metafísica em psicologia e estética? Como se adaptou ao petulante pluralismo das nossas sociedades liberais e ao turbilhão das suas extremas individualizações? Que aconteceu? Desapareceu definitivamente o inteligível, comunicativo e promissor poder da palavra de Deus? Que aconteceu com Deus?”
(Johann Baptist Metz, Memoria passionis. Una evocación provocadora en una sociedad pluralista, Santander: Sal Terrae, 2007)
21.7.07
Lectio Divina: Uma leitura familiar e orante da Biblia
Há um provérbio italiano que diz: «Tra il dire e il fare c’è di mezzo il mare» [= «Entre o dizer e o fazer há o mar de permeio»]. Serve este provérbio para apresentar a Lectio Divina como uma ponte, assente em oito pilares, que atravessa este mar, e que conduz, passo a passo, da análise do texto bíblico, passando pela meditação e oração prolongadas, à transformação da vida. O objectivo da Lectio Divina não é o mero deleite intelectual, o saber, mas a transformação da vida1. Eis então, de forma sumária, os oito pilares em que assenta a ponte da Lectio Divina, que ajudam a atravessar o mar que separa o «dizer» do «fazer», para chegarmos da leitura da Escritura à conversão do coração e à transformação da nossa vida.
1. Lectio ou Leitura. Consiste em ler e reler o texto, até lhe captar os elementos fundamentais, a estrutura, as personagens, as acções, a qualidade das acções, o contexto próximo e alargado, os passos paralelos que ajudam à sua melhor compreensão. Trata-se de um trabalho amplo e criterioso, cujo objectivo é responder à pergunta: «O que diz este texto?» Muitas vezes, antes de nos perguntarmos: «O que diz o texto?», começamos logo a exprimir algum pensamento sobre o texto. Nesta primeira etapa, é preciso ler com o lápis na mão, para anotar, sublinhar, remeter, articular.
2. Meditatio ou Meditação. Consiste em procurar encontrar os valores permanentes ou as mensagens que pervadem o texto. Responde à pergunta: «O que é que diz o texto e que valores permanentes veicula?» A resposta encontra-se quase sempre em palavras-chave, que há que repetir e saborear pausadamente – caminhar com as palavras – até ocuparem o nosso coração e marcarem o ritmo da nossa vida .
3. Contemplatio ou Contemplação. Colocamo-nos agora perante o amor de Deus, de Jesus Cristo com o Espírito Santo, operante na história. Neste ponto do percurso, o texto fala-me a mim e para mim, deixando de ser apenas um veículo de mensagens gerais. Responde à pergunta: «O que é que o texto me diz?»
4. Oratio ou Oração. Partindo sempre do texto, chegamos agora ao diálogo com o Senhor, mediante o louvor, a acção de graças, a súplica. Rezar é acolher a benevolência do Deus criador do mundo “sete vezes” bom, e nosso redentor. Bondade que, sendo acolhida, se traduz em bondade no nosso coração, nos nossos olhos, nos nossos lábios, nas nossas mãos. De forma penetrante, refere Franz Rosenzweig, que a oração institui uma nova ordem no mundo, ilumina o mundo. Não no sentido de que, rezando, recebemos uma luz nova para ver o mundo, mas no sentido de que, rezando, vemos o mundo iluminado pela luz nova e primeira da criação3 , o mundo “sete vezes” bom, dito e ordenado pela Palavra de Deus, e por Ele redimido. Refere Santa Teresa de Ávila, que «a oração é uma íntima relação de amizade; é estar com aquele de quem sabemos que nos ama». O amor verdadeiro é tranquilo, mas é ao mesmo tempo um risco, pois há nele um frémito, um estremecimento, um calafrio que gera em nós novos fundamentos, como quando o noivo diz para a noiva: «Tu és bela, minha amada, terrível como um exército em ordem de batalha!» (Ct 6,4)4 .
5. Consolatio ou Consolação. É a consolação (paráklêsis) neotestamentária, que provém do coração do Pai, e que nos anima à consolação dos nossos irmãos (2 Cor 1,3-7)5 . Provém também de Cristo Crucificado e Ressuscitado (Fl 2,1) e do Espírito Santo (Act 9,31), e chega ao coração dos aflitos (Mt 5,4), dos doentes (Mt 9,2.22) e da própria morte (1 Ts 4,18)6 . Neste ponto do nosso percurso, saboreamos a presença consoladora de Deus na nossa vida, sentimos o coração pleno de alegria, e experimentamos afinidade com os comportamentos propostos pela mensagem do texto.
6. Discretio ou Discernimento. Este é o momento em que, sempre sob a acção serena e soberana de Deus, me dedico ao discernimento de valores: valores e desvalores, valores evangélicos e contrafacções.
7. Deliberatio ou Deliberação. É agora o tempo de fazer escolhas, de escolher estilos de vida plenamente conformes ao Evangelho.
8. Actio ou Acção. Agora estou diante de Deus, e com a minha vida nas mãos. Feitas as escolhas de acordo com o Evangelho, este é o tempo de perguntar «O que fazer?», de empreender acções concretas que mudem o coração e convertam a vida.
De acordo com as etapas apresentadas, passo agora a exemplicar o funcionamento do percurso, a partir de uma rede de textos do Livro dos Actos dos Apóstolos: «a diaconia do apostolado» (Act 1,21-22.25), que reclama «a Ascensão e a Vinda» do SENHOR JESUS (Act 1,9-11), cenário a que estão agrafados «os primeiros ACTOS dos Apóstolos» (Act 3,1-10; 14,8-10), respectivamente de Pedro e de Paulo, em mundo judeu e em mundo pagão.
II. DIACONIA DO APOSTOLADO, ASCENSÃO E VINDA DO SENHOR
E OS PRIMEIROS ACTOS DOS APÓSTOLOS
1. Leitura
Aquando da escolha de Matias para «a diaconia (ou serviço) do apostolado» (hê diakonía tês apostolês) abandonada por Judas (Act 1,25), Pedro pronuncia estas palavras indicativas:
«21É necessário (deî), pois, que, dos homens que vieram connosco (synérchomai) durante todo o tempo em que entrou e saiu à nossa frente o SENHOR JESUS, 22tendo começado desde o Baptismo de João até ao dia em que ELE foi arrebatado (anelêmphthê)7 diante de nós, um destes se torne connosco testemunha da sua Ressurreição» (Act 1,21-22).
Nas palavras de Pedro, «o serviço do apostolado», que consiste em tornar-se testemunha da Ressurreição do SENHOR JESUS, requer, de todos aqueles que a ele se venham a dedicar, três condições fundamentais: 1) ter feito todo o caminho connosco, e sempre atrás do SENHOR JESUS; 2) atrás do SENHOR JESUS traduz a atitude do discípulo: sempre com o Mestre; nunca, porém, à frente do Mestre, mas seguindo-O sempre de perto no caminho; 3) o caminho tem um começo e um termo assinalados, sempre com referência ao Mestre: desde o Baptismo d’Ele até ao dia do Arrebatamento d’Ele diante de nós.
Fixemo-nos no termo do caminho, na Ascensão do SENHOR JESUS diante de nós. O texto, sóbrio e limpo, do Livro dos Actos, diz assim:
«9E estas coisas tendo dito, vendo (blépô) eles, ELE foi Elevado (epêrthê) , e uma nuvem O subtraiu (hypolambáno) dos olhos deles (apò tôn ophthalmôn autôn). 10E como tinham o olhar fixo (atenízontes) no céu para onde ELE ia, eis (idoú)9 dois homens que estavam ao lado deles, em vestes brancas, 11e DISSERAM: “Homens Galileus, por que estais de pé, perscrutando (emblépontes) o céu? Este JESUS que foi arrebatado (analêmphtheís)10 diante de vós para o céu, assim VIRÁ (eleúsetai) do modo (trópos) que O vistes (etheásthe) IR para o céu”» (Act 1,9-11).
Impressionante condensado de OLHARES. Seis notas visuais soam no texto. Tanto VER sucede a um telegráfico aceno ao dizer: «Estas coisas tendo dito». Referia-se o narrador àquilo que o SENHOR JESUS lhes tinha dito durante uma refeição: que não se afastassem de Jerusalém, que esperassem a promessa do Pai, o Baptismo do Espírito Santo (Act 1,4-5), e assim seriam testemunhas d’Ele em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até aos confins da terra (Act 1,8). Dizer testamentário e programático numa refeição testamentária e programática11 .
Tanto VER. Da panóplia de verbos registrados (blépô, atenízô, horáô, emblépô, theáomai), os mais fortes e intensos são, com certeza, atenízô [= «olhar fixamente»]12 e emblépô [= «perscrutar», «ver dentro»]. Ambos exprimem a observação profunda e prolongada, para além das aparências: VER o invisível (cf. Hb 11,27), VER o céu, VER a glória de Deus13 . Mas mais ainda do que o que se vê, estes verbos acentuam o modo como se vê14 .
É para aí que apontam os dois homens vestidos de branco, de rompante surgidos na cena, para entregar um importante DIZER que interpreta e orienta tanto VER. Já os tínhamos encontrado no túmulo reorientando os olhos entristecidos das mulheres: «Por que (tí) procurais entre os mortos Aquele que está Vivo? Não está aqui. Ressuscitou!» (Lc 24,5-6). Dizem agora: «Por que (tí) estais de pé, perscrutando (emblépontes) o céu? Este JESUS que foi arrebatado (analêmphtheís) diante de vós para o céu, assim VIRÁ (eleúsetai) do modo (trópos) que O vistes (etheásthe) IR para o céu» (Act 1,11).
Ao Arrebatamento de JESUS para o céu, os dois homens vestidos de branco agrafam a Vinda de JESUS. Importante colagem da Ascensão com a Vinda. E importante passo em frente para quem estava ali simplesmente especado. Não é mais possível Ver a Ascensão sem Ver a Vinda. Sim, Ver. Porque ELE Virá do mesmo modo que O Vistes IR. Importante guardar este Ver, viver este Ver, Ver com este Ver. Porque é Vendo assim que o SENHOR Virá. Vinda que não tem de ser relegada para uma Parusia distante e espectacular, mas que começa, hic et nunc, neste Olhar novo e significativo de quem Vê o SENHOR JESUS. Vinda que não é tanto um regresso, mas o desvelamento de uma presença permanente15 . Vinda já em curso, portanto, ainda que não plenamente realizada16 .
Quando atrás Pedro elencava as condições requeridas e necessárias para alguém se poder dedicar ao «serviço do apostolado», tornando-se connosco testemunha da Ressurreição do SENHOR JESUS, víamos que era preciso ter feito connosco e atrás do Mestre o caminho que vai desde o Baptismo d’ELE até ao dia do Arrebatamento d’ELE diante de nós. Podemos ser agora mais precisos naquilo que ao termo deste caminho diz respeito. Já não se trata apenas de dar testemunho do Senhor Ressuscitado e Elevado ao céu, mas de dar testemunho do Senhor Ressuscitado e Elevado ao céu e que Vem no mistério do Olhar dos seus Apóstolos17 .
Guardemos este Olhar e prossigamos. Eis-nos no primeiro ACTO propriamente dito dos Actos dos Apóstolos depois do Pentecostes: a cura de um coxo de nascença descrita em Act 3,1-10:
«1Então Pedro e João subiam ao Templo para a oração da hora nona18 . 2E um certo homem, que era coxo (chôlós) desde o ventre da sua mãe, era trazido e posto todos os dias diante da Porta do Templo, dita a Bela19 , para pedir esmola àqueles que entravam no Templo. 3Vendo (idôn) Pedro e João, que estavam a entrar no Templo, pedia esmola para receber. 4Então, fixando o olhar (atenísas) nele, Pedro, com João, disse: “Olha para nós” (blépson eis hemâs). 5Então ele observava-os (epeîchen), esperando receber deles alguma coisa. 6Disse então Pedro: “Prata e ouro não tenho, mas o que tenho, isso te dou: no nome de JESUS CRISTO, o Nazareno, [levanta-te e] caminha. 7E, tomando-o pela mão direita, levantou-o. Imediatamente se firmaram os seus pés e os calcanhares. 8Com um salto, pôs-se em pé, e caminhava, e entrou com eles no Templo caminhando e saltando e louvando a Deus. 9E todo o povo o viu (eîden) a caminhar e a louvar a Deus. 10E reconheciam que era aquele que, sentado, pedia esmola à Porta Bela do Templo, e ficaram cheios de admiração e de assombro por aquilo que lhe aconteceu» (Act 3,1-10).
Outro impressionante condensado de olhares marca este primeiro ACTO dos Actos dos Apóstolos. Soam no texto cinco notas visuais, servidas por quatro verbos: horáô, atenízô, blépô, epéchô. Atenízô desenha o Olhar de Pedro e João fixado no coxo de nascença. Blépô retrata o Ver com que o coxo é mandado olhar o Olhar dos Apóstolos.
Significativo agrafo: estes dois Olhares, com atenízô e blépô, só tinham sido usados antes, no Livro dos Actos dos Apóstolos, uma única vez, precisamente no relato da Ascensão (Act 1,9-10)20 . De resto, blépô conhecerá apenas mais quatro menções no Livro dos Actos dos Apóstolos: duas no relato da vocação de Paulo (Act 9,8-9), a terceira no discurso de Paulo na sinagoga de Antioquia da Pisídia (Act 13,41; cit. de Hab 1,5), e a quarta e última no decurso da viagem marítima de Paulo para Roma (Act 27,12). Atenízô, por sua vez, far-se-á notar em lugares de relevo, sempre para expressar um Ver novo e significativo, um Ver sem haver: os membros do Sinédrio fixam os olhos (atenízô) em Estêvão, e vêem-no semelhante a um anjo (Act 6,15); Estêvão, por sua vez, fixa os olhos (atenízô) no céu, e vê a glória de Deus e JESUS, de pé, à direita de Deus (Act 7,55); Cornélio fixa os olhos (atenízô) no anjo do Senhor, que o interpela (Act 10,4); Pedro fixa os olhos (atenízô) na visão, vinda do céu, dos animais impuros (Act 11,6); Paulo fixa os olhos (atenízô) no mago Elimas, de Chipre, para o fulminar pela sua falsidade e malícia (Act 13,9), e o mesmo faz no Sinédrio, dando testemunho de JESUS (Act 23,1).
É este Ver JESUS, Ver sem haver, sem poder, sem ouro nem prata (Act 3,6), que se fixa sobre o coxo de nascença, mandado, por sua vez, olhar para este Olhar, Ver desta maneira. Como Abraão e Moisés, convidados a Ver para receber, e não para haver21 , a Terra Prometida: «a terra que Eu te farei Ver» (Gn 12,1), «que YHWH lhe fez Ver» (Dt 34,1), «Eu a fiz Ver aos teus olhos» (Dt 34,4). O narrador anota mais à frente que o coxo de nascença, agora curado, tinha mais de 40 anos (Act 4,22), tipologia do povo perdido no deserto antes de entrar na Terra Prometida22 . Como o homem doente havia 38 anos, que Jesus encontra junto da piscina de Bezetha, e que será curado (Jo 5,1-9)23 .
Um Olhar cheio de JESUS faz Ver JESUS. É este o Ver dos Apóstolos. Sem poder, sem ouro nem prata. É neste novo Ver que o coxo de nascença entra. Mas ali mesmo ao lado, o povo disperdia o olhar. Fixava os olhos (atenízô) nos pretensos poderes de Pedro e João (Act 3,12), não em JESUS. Pedro corrige esses olhares, apontando JESUS como Aquele que curou o coxo de nascença (Act 3,12-16).
É sintomático que o Ver da Ascensão e da Vinda do SENHOR JESUS seja o Ver que preenche por inteiro o primeiro ACTO dos Actos dos Apóstolos, com realce para Pedro.
Mas é ainda grandemente sintomático que o primeiro ACTO de Paulo, descrito em Act 14,8-10, que é também o primeiro passo da missão perante o paganismo popular24 , em Listra, quase copie o primeiro ACTO dos Apóstolos e de Pedro, certamente com o intuito de pôr em paralelo os dois grandes Apóstolos e os dois tempos da missão25 . Eis o texto referido de Act 14,8-10:
«8E em Listra um homem estava sentado, sem força nos pés, coxo desde o ventre da sua mãe, e que nunca tinha andado. 9Este ouviu falar Paulo, o qual, tendo fixado os olhos (atenísas) nele, e tendo visto que tinha fé para ser salvo, 10diz com voz forte: “Levanta-te direito sobre os teus pés!” E ele deu um salto e caminhava» (Act 14,8-10).
Aqui temos o mesmo coxo de nascença, o mesmo Olhar significativo e diaconal, sem poder, sem ouro nem prata, Ver JESUS, o mesmo levantamento do coxo. E também aqui, na sequência do texto, temos o aceno à multidão que disperdia o olhar, vendo em Paulo e Barnabé deuses em forma humana, e a mesma correcção, feita por Paulo, apontando JESUS (Act 14,11-18).
2. Meditação
Todos reunidos com os olhos fixos no céu,/ Pedro e João, Paulo e Barnabé, com os olhos fixos num coxo de nascença,/ o caminho feito com JESUS, seguindo JESUS, desde o Baptismo d’ELE até ao dia do Arrebatamento d’ELE com a Vinda d’ELE./ Andar COM ELE, para aprender a viver COM ELE, COMO ELE, dando testemunho d’ELE./ Ver e testemunhar o SENHOR Ressuscitado, vivo e actuante no meio de nós./ Vendo o SENHOR Ressuscitado, Ver também o irmão necessitado./ Ver como quem anuncia a Sua presença vivificante e sanadora./ Um Olhar livre e libertador, não enviesado nem enfezado nem indiferente, invejoso, rancoroso ou ciumento./ Sem preconceitos./ Um Olhar frontal, limpo, atencioso e carinhoso./ Um Olhar de graça, recebida e dada./ Um Olhar diaconal, novo e significativo, recebido, um Olhar testemunhal, em primeira pessoa, que anuncia a todos e em toda a parte: «VI o SENHOR» (Is 6,1; Jo 20,18)./ O «serviço do apostolado», gratuito e humilde e dedicado./ A dádiva da cura ao coxo de nascença, marginalizado, posto à porta, que entra finalmente em Casa, na Casa da comunhão e do louvor.
3. Contemplação
Vi o SENHOR./ Mas sou sempre primeiro Visto pelo SENHOR, que me chama a segui-l’O: «Vinde e Vede» (Jo 1,38-39)./ Eu sou, talvez, coxo ou cego ou rico de nascença./ Mas ELE, vendo dentro de mim (emblépô), ama a miséria que há em mim, a riqueza que há em mim, a mentira que há em mim, o orgulho que há em mim, a violência que há em mim, a indiferença que há mim, e interpela-me, dizendo: «Uma coisa te falta: vai, quanto tens vende, e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu, e depois segue-me» (Mc 10,21)./ Obrigado, SENHOR, pelo caminho novo que me apontas sempre./ Tu és o Caminho.
4. Oração
«Vem, Senhor Jesus!»/ Que o teu Olhar incendeie o meu olhar./ Que eu Veja como Tu me vês./ Que o meu Olhar, agraciado pelo Teu Olhar de Graça e de Bondade, seja também um Olhar agraciador, para que eu Te saiba levar aos meus irmãos./ Cria em mim, SENHOR, um coração novo, um espírito novo, um Olhar novo que ilumine todos os meus ACTOS, e que os meus ACTOS anunciem a Tua Vinda, isto é, revelem e desvelem a tua presença./ Comprometi-me a seguir o Teu caminho todo, mas ainda me desvio muitas vezes dos mais pobres./ Ainda me desvio muitas vezes da alegria e do amor verdadeiros, sem retorno, e ainda me perco tantas vezes à procura de outras consolações e seguranças.
5. Consolação
Mas Tu és o Consolador que nunca falta./ Sei que estás comigo também nos momentos mais difíceis da minha vida./ Olhas para mim, chamas por mim, interpelas-me, levantas-me, às vezes sacodes-me./ Quiseste ficar sempre connosco e comigo./ Ficarei contigo para Ver melhor o Teu Olhar e ouvir melhor a Tua voz./ Para Ver melhor os meus irmãos e ouvir melhor a sua voz./ Até que a maldade caia, como escamas, dos meus olhos e do meu coração./ Até que em mim haja só Bondade e benevolência e mansidão./ Então, sim, Tu serás o SENHOR da minha vida./ De forma transparente, o meu Olhar deixará então passar o Teu Olhar consolador, que cura os meus irmãos, e o louvor do Teu Nome ouvir-se-á maior e mais puro.
6. Discernimento
Aí tens, SENHOR, a minha vida aberta e disponível./ Bem sei que os meus olhos estão muitas vezes cheios de ganância, luxúria, inveja, ciúme, coisas de ouro e prata, a que S. Paulo chama lixo (Fl 3,8)./ Conheço a história da trave e do argueiro (Mt 7,1-5)./ Bem sei que muitas vezes vejo mal, e de lado, e à pressa, os meus irmãos./ Bem sei que muitas vezes vejo com um olhar patronal, e não diaconal./ Bem sei também que os meus olhos devem estar cheios de Ti, SENHOR, e atentos carinhosamente aos meus irmãos.
7. Deliberação
Cheio de mim ou cheio de Ti?/ Estou no centro das atenções ou sei orientar todos os olhares para Ti?/ Conheço-Te e celebro-Te e dou testemunho da Tua Ressurreição?/ Os meus ACTOS anunciam a Tua Vinda, isto é, revelam e desvelam a Tua presença permanente?/ Ou será que o meu olhar é mau porque Tu és Bom? (Mt 20,15; cf. Ecli 14,9-10)/ Por que é que eu tenho tão poucos (ou nenhuns) encontros CONTIGO marcados na minha agenda?/ O que faço eu com o relógio na mão o dia inteiro?/ Por que corro tanto e para onde corro tanto?/ Debruço-me com amor, e com tempo, sobre os meus irmãos abandonados à beira do caminho ou postos à entrada da porta?
8. Acção
Hoje ouvi a Tua palavra, SENHOR./ Hoje Vi o Teu rosto, o Teu Olhar intenso e penetrante./ Vou dizer e testemunhar aos meus irmãos, aos Teus irmãos, que Tu nos precedes sempre, nos presides sempre./ «Ai de mim se não anunciar o Evangelho!» (1 Cor 9,16)./ Ai de mim se não relatar a Tua história com a minha vida, para que se revele e se desvele a Tua presença salvadora no meio de nós./ Vem, SENHOR JESUS, nos meus humildes ACTOS de Hoje!
P. António Couto
NOTAS
_________________________________
[1] Acerca desta metodologia, ver C. M. MARTINI, Nel sabato del tempo. Discorsi, interventi, lettere e omelie 2000, Bolonha, Dehoniane, 2001, p. 233-235.
[2] Ver, a propósito, A. GRÜN, In cammino. Una teologia del peregrinare, Pádua, Messaggero, 2005, p. 48-51.
[3] F. ROSENZWEIG, La stella della redenzione, Génova, Marietti, 3.ª impressão da 2.ª edição, 1998, p. 288; C. DI SANTE, Vedere con gli ochi della Bibbia. Temi di spiritualità, Turim, Elle Di Ci, 1999, p. 77-78.
[4] P. BEAUCHAMP, Parler d’Écritures Saintes, Paris, Seuil, nova impressão, 2003, p. 39.
[5] Esta página de 2 Cor 1,3-7 contém dez menções do termo paráklêsis, sendo por isso um dos passos mais significativos da «consolação» no NT. Veja-se, por exemplo, M. J. HARRIS, The Second Epistle to the Corinthians. A Commentary on the Greek Text, Grand Rapids, Eerdmans, 2005, p. 139-150.[6] Ch. AUGRAIN, Consoler, in X. LÉON-DUFOUR (ed.), Vocabulaire de Théologie Biblique, Paris, Cerf, 8.ª ed., 1995, col. 208-210.
[7] Aoristo passivo de analambánô.
[8] Aoristo passivo de epaírô.
[9] Imperativo aoristo médio de horáô, usado como partícula demonstrativa. E. G. JAY, New Testament Greek. An Introductory Grammar, Londres, 11.ª impressão da primeira edição (1958), 1983, p. 246.
[10] Particípio aoristo de analambánô.
[11] Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce. Lecture des Actes des Apôtres. 2. Lecture continue, Bruxelas, Éditions de l’Institut d’Études Théologiques, 1995, p. 109; J. ROCHETTE, Regard et guérison, présence nouvelle du Christ à son Église dans la «diaconie de l’apostolat» (Act 1,25), in Nouvelle Revue Théologique, 125, 2003, p. 211.
[12] O verbo atenízô é de cariz muito lucano. De facto, encontra-se 14 vezes no NT, das quais 12 vezes em Lucas, 02 no Evangelho e 10 nos Actos dos Apóstolos. G. ROSSÉ, Atti degli Apostoli. Commento esegetico e teologico, Roma, Città Nuova, 1998, p. 176, nota 25.
[13] D. ELLUL, Actes 3/1-11, in Études Théologiques et Religieuses, 64, 1989, p. 97; R. STRELAN, Strange Stares: atenizeîn in Acts, in Novum Testamentum, 41, 1999, p. 235-255.
[14] J. ROCHETTE, Regard et guérison, p. 212.
[15] Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce, II, p. 121.
[16] Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce, II, p. 123-124.
[17] J. ROCHETTE, Regard et guérison, p. 213.
[18] 15 horas. Hora da Morte de Jesus (Lc 23,44) e do “holocausto perpétuo” (tamîd) da tarde (Ex 29,39-42), em que se faz a oração da “oferta” (minhah). Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce, II, p. 163, e nota 149.
[19] Trata-se certamente da porta que dava acesso do átrio dos gentios para o átrio das mulheres, e não da chamada porta de Nicanor, que dava acesso do átrio das mulheres para o átrio de Israel. Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce, II, p. 163.
[20] J. ROCHETTE, Regard et guérison, p. 215.
[21] A. WÉNIN, Abraham: élection et salut. Réflexions exégétiques et théologiques sur Genèse 12 dans son contexte narratif, in Revue théologique de Louvain, 27, 1996, p. 10-11.
[22] Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce, II, p. 164.
[23] J. L. SKA, La strada e la casa. Itinerari biblici, Bolonha, Dehoniane, 2001, p. 190-191.
[24] G. ROSSÉ, Atti degli Apostoli, p. 537.
[25] Ph. BOSSUYT, J. RADERMAKERS, Témoins de la Parole de la Grâce, II, p. 424-426; J. R
Genesis 18, 1-10
XVI Domingo do Tempo Comum
Lc 10, 38-42
Enquanto Jesus caminha para Jerusalém chega a uma aldeia de Betânia, onde é acolhido por Marta e Maria (cf. Jo 11,1-44; 12,1-11), irmãs de Lázaro, que tantas vezes o hospedavam em sua casa, oferecendo-lhe o conforto da amizade e um lugar de repouso ao «Filho do homem que não tem onde repousar a cabeça» (cf. Lc 9,58).
Marta convida Jesus a entrar e mete-se logo a servi-lo, numa atitude que parece exemplar: prepara a mesa, prepara a refeição, dispõe tudo para fazer festa àquele hóspede que ela reconhece como Mestre e Senhor… Maria, pelo contrário, quase raptada pela presença de Jesus, faz outra coisa: senta-se aos seus pés e escuta com todo o seu ser as palavras de Jesus. Isto é dar atenção ao hóspede que se recebe e escutar aquilo que nos veio dizer. São duas diversas modalidades de acolhimento do Senhor, igualmente atenciosas. Mas eis que o generoso activismo de Marta e o seu «corre daqui para ali» pelos muitos serviços que tem a fazer leva-a a acusar a sua irmã: «Senhor, não te preocupa que minha irmã me tenha deixada só a servir? Diz-lhe que me venha ajudar». Diante de tal pedido Jesus realiza um lúcido discernimento e emite um juízo claro, dando um ensinamento fundamental aos seus discípulos de todos os tempos: «Marta, Marta, tu andas atarefada com muitas coisas, mas uma só é a coisa necessária. Maria escolheu a porção boa (não ‘melhor’), que não lhe será tirada».
Qual é o significado destas palavras? É preciso antes de mais esclarecer que Jesus não está a contrapor ‘vida activa’ e ‘vida contemplativa’, como se rezar fosse ‘melhor’ que servir concretamente os irmãos, mesmo se infelizmente desde a antiguidade se deu às suas palavras esta interpretação redutiva. Por outro lado, Jesus amava a comunhão da mesa e agradava-lhe a solicitude de quem se afadigava para tornar a própria mesa um lugar no qual o comer juntos era sinal de alegria e diálogo fraterno… Hospedar não é apenas «fazer coisas» a quem nos visita, mas também dar-lhe o próprio tempo, fazer de si um espaço para o outro através da escuta.
Eis porque Jesus distingue entre «as muitas coisas» pelas quais Marta se preocupa e a «única coisa necessária», a «boa porção» escolhida por Maria. Marta está aflita, está cheia de preocupações; várias vezes Jesus alertou os seus discípulos para que não caíssem reféns desta «doença» tão subtil quão perigosa: «Não vos preocupeis com o amanhã, mas procurai primeiro o Reino de Deus» (cf. Lc 12, 22-31); «Estai atentos para que os vossos corações não fiquem pesados pelas preocupações» (Lc 21, 34)… Para nós cristãos um deveria ser o desejo essencial, não aqueles muitos desejos com os quais somos tentados de nos afligirmos: a escuta assídua do Senhor, isto é, deixar que Cristo seja o Senhor da nossa vida, que seja ele, com a sua palavra e as suas acções a orientar a nossa existência; ele de quem o Pai proclamou: «Este é o meu Filho, o amado, escutai-O!» (Mc 9,7). Não basta servir, é preciso tornar-se servos e Maria, estando aos pés de Jesus para escutar a sua palavra, é como a serva do Senhor atenta à sua voz.
Não esqueçamos que também hoje na igreja o «fazer serviços» pode tornar-se uma militância que faz barulho, que agita, que julga os outros que se comportam diversamente, que se fecha à escuta até se distanciar para percorrer os próprios caminhos, até perder o estilo evangélico.
Sim, Marta e Maria habitam em nós de modo quase inseparável. Muitas vezes é Marta que prevalece, que se apresenta em primeiro lugar, impelindo-nos a correr ao encontro de Jesus —e aos outros, no qual está presente (cf. Mt 25, 31-46)—, a acolhê-lo até festivamente, mas pondo em primeiro plano o nosso activismo, sem nos metermos realmente ao seu serviço… Maria, pelo contrário, dorme nas nossas profundidades: para a deixar emergir é preciso morrer para o próprio egoísmo e ressurgir na atitude de quem se põe aos pés de Jesus para escutar com um coração uno a sua palavra. Só assim poderemos fazer todas as coisas bem e seremos felizes, segundo a promessa de Jesus: «Felizes aqueles que escutam a palavra de Deus e a põem em prática» (Lc 11, 28). Não esqueçamos, portanto, o convite do Senhor: «Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e me abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele e ele comigo» (Ap 3,20).
Enzo Bianchi
Prior de Bose
Trad: mro
14.7.07
XV Domingo do Tempo Comum
Lc. 10, 25-37
Um doutor da Lei interroga Jesus colocando-lhe a pergunta essencial: «Mestre, que hei-de fazer para receber como herança a vida eterna?», uma vida que não termine aqui sobre a terra, mas continue para sempre, no Reino? A pergunta posta por este homem é extremamente séria; ela está porém viciada pela atitude que o move: «perguntou a Jesus para o colocar à prova». É o mesmo comportamento de Satanás (cf. Lc 4,2), é o daquele que entra no diálogo com Jesus não para viver as suas palavras, mas que se serve de todos os meios, mesmo da Lei de Deus, para lhe estender uma armadilha.
Jesus não polemiza, mas reenvia o seu interlocutor para a sua cátedra, convidando-o a responder por si mesmo: «O que está escrito na Lei? Como lês tu?». O outro fornece-lhe uma resposta impecável, citando duas passagens da Torah que, juntas, formam o primeiro e o mais importante dos mandamentos, o coração da vontade de Deus revelada nas Escrituras: «Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua mente e com todas as tuas forças (Dt 6,5) e o próximo como a ti mesmo (Lv 19, 18)». Trata-se de um preceito que não deve ser sequer comentado, mas vivido! Eis porque Jesus replica: «Respondeste bem. Faz isso e viverás», terás a vida eterna. Aqui poderia terminar o encontro…
Mas o doutor da Lei, evidentemente chocado pela natureza da afirmação: «Faz isso», começa a justificar-se. Ele procura um astuto atalho que lhe consinta auto-absolver-se, evitar o face a face com o seu próprio coração duplo, não disposto a realizar o que conhece como coisa boa que deve ser realizada. E o faz com uma pergunta genérica: «Quem é o meu próximo»? Sim, porque o que lhe inquieta é a aplicação do mandamento do amor. Ou, quem deve ser objecto do seu amor? O próximo? Os concidadãos? Os irmãos na fé? Os outros?
Eis então que Jesus põe com clareza este homem diante de si mesmo e diante da sua responsabilidade pessoal, contando-lhe aquela que é conhecida como a parábola do bom samaritano. Enquanto descia de Jerusalém para Jericó um homem foi assaltado por bandidos, que o derrubam e o deixam meio morto na berma da estrada. Junto dele passa um sacerdote e um levita, «homens religiosos» que conhecem bem a Lei de Deus, os quais fingem não vê-lo: fazem tudo para não parar, para não se aproximarem do desgraçado em perigo de vida, e assim são julgados por si mesmos como potenciais homicidas, distantes do irmão tanto quanto o são de Deus. Sobre aquela estrada passa depois um samaritano, o «inimigo» religioso para os judeus, o crente cismático e herético (cf. Lc 9,53; Jo 4,9). Ele aproxima-se do homem ‘meio morto’, faz-se próximo de quem precisa, toma conta dele: cura-lhe as feridas, carrega-o sobre o próprio jumento e leva-o a uma hospedaria onde dá instruções, prometendo pagar as despesas da sua estadia.
No fim da parábola Jesus põe ao doutor da Lei a pergunta crucial: «Quem destes três te parece ter sido próximo daquele homem que caiu nas mãos dos bandidos?». O outro responde: «Aquele que usou de misericórdia». E Jesus disse-lhe: «Vai e faz o mesmo». Deste modo reenvia-o à sua responsabilidade, indicando-lhe o que é preciso fazer para herdar a vida eterna: não só sentir misericórdia, mas fazer misericórdia àqueles que se encontram ao longo das estradas da vida, deixando-se tocar pela sua indigência… Isto vale também para nós, para o nosso quotidiano. Não devemos perguntar-nos: «quem é o meu próximo», mas «de quem me faço próximo, de quem me aproximo?». Podemos de facto passar uma vida inteira ao lado de outras pessoas sem nunca nos decidirmos a ir ao seu encontro e de fazer nossos os seus sofrimentos, isto é de não com-sofrer com eles…
Jesus pediu-nos que vivêssemos um amor concreto, real, depois de nos ter precedido, ele mesmo, neste caminho. É ele, de facto, segundo a interpretação dos mais antigos padres da Igreja, o bom Samaritano que, movido pela compaixão, se fez vizinho da humanidade prostrada e ferida; é ele que com toda a sua existência nos narrou as vísceras de misericórdia do Pai (cf. Lc 6,36); é ele que ainda hoje, depois da sua morte e ressurreição, diz a cada um de nós: «Trata bem do irmão e eu te recompensarei quando voltar»…
Enzo Bianchi
Prior de Bose
[trad: mro]
12.7.07
Subsistit?
RESPOSTAS A QUESTÕES RELATIVAS A ALGUNS ASPECTOS
DA DOUTRINA SOBRE A IGREJA
Introdução
É de todos conhecida a importância que teve o Concílio Vaticano II para um conhecimento mais profundo da eclesiologia católica, quer com a Constituição dogmáticaLumen gentium quer com os Decretos sobre o Ecumenismo (Unitatis redintegratio) e sobre as Igrejas Orientais (Orientalium Ecclesiarum). Muito oportunamente, também os Sumos Pontífices acharam por bem aprofundar a questão, atendendo sobretudo à sua aplicação concreta: assim, Paulo VI com a Carta encíclica Ecclesiam suam (1964) e João Paulo II com a Carta encíclica Ut unum sint (1995).
O sucessivo trabalho dos teólogos, tendente a ilustrar com maior profundidade os múltiplos aspectos da eclesiosologia, levou à produção de uma vasta literatura na matéria. Mas, se o tema se revelou deveras fecundo, foi também necessário proceder a algumas chamadas de atenção e esclarecimentos, como aconteceu com a DeclaraçãoMysterium Ecclesiae (1973), a Carta aos Bispos da Igreja Católica Communionis notio (1992) e a Declaração Dominus Iesus (2000), todas elas promulgadas pela Congregação para a Doutrina da Fé.
A complexidade estrutural do tema, bem como a novidade de muitas afirmações, continuam a alimentar a reflexão teológica, nem sempre imune de desvios geradores de dúvidas, a que esta Congregação tem prestado solícita atenção. Daí que, tendo presente a doutrina íntegra e global sobre a Igreja, entendeu ela dar com clareza a genuína interpretação de algumas afirmações eclesiológicas do Magistério, por forma a que o correcto debate teológico não seja induzido em erro, por motivos de ambiguidade.
8.7.07
Confiar é acreditar que o outro é capaz do impossivel
Na vida e missão de Jesus sempre ecoaram estas palavras: «Tende confiança. Sou eu. Não temais». Confiar é acreditar que o outro é capaz do impossível. É recomeçar quando tudo parece destroçado, quando a vida parece fugir-nos. Porque o importante, dizia Vergílio Ferreira, «não é o que a vida fez de nós, mas o que nós fizemos com o que a vida fez de nós».
7.7.07
Papa anuncia Ano Paulino
Bento XVI anunciou estes dias a celebração de um "especial ano jubilar" dedicado ao Apóstolo Paulo, por ocasião dos 2000 anos do seu nascimento. O Ano Paulino irá prolongar-se de 28 de Junho de 2008 a 29 de Junho de 2009. Este anúncio foi sublinhado com uma salva de palmas por parte dos fiéis que estavam presentes na Basílica de São Paulo fora de muros, para a celebração das I Vésperas da Solenidade dos Apóstolos Pedro e Paulo. Bento XVI lembrou que Paulo passou de "violento perseguidor dos cristãos" a Apóstolo de Jesus e por ele "sofreu e morreu". "Como é actual, hoje, o seu exemplo", exclamou. O nascimento de Paulo é colocado pelos historiadores entre o ano 7 a 10 depois de Cristo. O Papa indicou que Roma será um local privilegiado para a celebração deste Ano Paulino, dado que a cidade conserva o túmulo de São Paulo, descoberto na Basílica romana de São Paulo fora de muros. "Na Basílica papal e na antiga abadia beneditina poderão ter lugar uma série de eventos litúrgicos, culturais e ecuménicos, pastorais e sociais, todos respeitantes à espiritualidade paulina", disse. Um destaque especial vai ser dada às peregrinações junto ao túmulo do Apóstolo. Congressos de estudo e publicações especiais de textos paulinos juntam-se a estas iniciativas, para "fazer conhecer cada vez melhor a imensa riqueza dos ensinamentos" de São Paulo, verdadeiro "património da humanidade redimida em Cristo". Iniciativas análogas poderão ser realizadas noutras partes do mundo, promovidas por muitas das Instituições que levam o nome de São Paulo ou se inspiram nos seus ensinamentos.
Paulo foi uma das figuras que marcou, de forma decisiva, a história do Cristianismo, o Apóstolo que anunciou o Evangelho em todo o mundo antigo, sem nunca vacilar perante as dificuldades, os perigos, a tortura, a prisão ou a morte. Nasceu na cidade de Tarso, na Silícia, numa família judaica na diáspora, mas com cidadania romana. Paulo não foi primariamente um escritor, mas um rabino convertido na célebre “Visão de Damasco” (Act 9,1-19; Act 22,4-21; Act 26,9-18) que percorreu muitos milhares de quilómetros, anunciando de cidade em cidade o “Evangelho” da morte e ressurreição de Jesus. Morreu em Roma, no ano 67. O nome de Paulo aparece como autor de 13 Cartas do Novo Testamento, escritas a diferentes comunidades, ao longo de uns cinquenta anos: Romanos, Gálatas, 1 Tessalonicenses, 1 e 2 Coríntios, Filipenses e Filémon; 1 e 2 Timóteo, Tito, Efésios, Colossenses, 2 Tessalonicenses. Teologicamente falando, Paulo assimilou o sistema teológico dos cristãos de origem helenista, que antes perseguia, e começou a pregação contra o sistema judaico, que antes seguia com rigor de fariseu. Os próprios judeo-cristãos de Jerusalém foram certamente poupados na sua “perseguição” ao Cristianismo nascente, porque salvavam a relação umbilical entre Cristo e Moisés e não pareciam a Paulo mais do que um “desvio” farisaico. Esta inculturação do Evangelho na cultura helenista – tipicamente citadina – levou Paulo, homem da cidade, a utilizar uma linguagem mais teológica e abstracta, própria do ambiente evoluído em que pregou o Evangelho, em contraposição com a linguagem campestre utilizada por Jesus no ambiente agrícola e pastoril da Palestina.
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XIV Domingo do Tempo Comum
Lc. 10, 1-12.17-20
O excerto evangélico de hoje apresenta-nos as exigências da missão cristã: como podemos, nós cristãos, anunciar a todos os homens a boa nova que em Jesus Cristo o Reino de Deus se fez muito próximo?
No evangelho segundo Lucas não é descrito apenas o envio dos doze apóstolos a Israel (cf. Lc 9, 1-6): durante a subida para Jerusalém Jesus, depois de ter anunciado as exigências da vocação a duas pessoas que lhe pedem para o seguir e a um terceiro que ele mesmo chama (cf. Lc 9, 57-62), «designa outros setenta e dois discípulos e os envia dois a dois para irem à sua frente a todas as cidades onde está para chegar». A missão aos gentios é assim prefigurada, nos setenta e dois povos da terra conhecidos pela tradição judaica (cf. Gn. 10), que chegará aos confins da terra depois da morte e ressurreição de Jesus (cf. Lc 24,47).
«A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos»: estes poucos são os doze, são os setenta e dois, são a comunidade em minoria no seio do judaísmo e do mundo pagão; é «o pequeno rebanho» (Lc 12,32), nome cunhado por Jesus para a sua igreja de todos os tempos. E no entanto a desproporção entre a ingente messe e a escassez dos operários pode ser colmatada pela oração para que o Senhor da messe envie operários: no momento do envio dos discípulos o primeiro mandamento é a oração. De resto, não há missão que não seja precedida de súplica a Deus; não há evangelização sem pedir que «Deus abra a porta da pregação e assim possamos anunciar o mistério de Cristo» (Col 4,3). De resto, não tinha o próprio Jesus dado o exemplo, rezando antes de chamar os doze (cf. Lc 6, 12-13)?
Ora Jesus envia aqueles poucos discípulos não sozinhos mas dois a dois porque a sua comunhão fraterna é já anúncio do Reino: o Evangelho que encontra no amor o seu centro é testemunhado por pessoas que se suportam e corrigem mutuamente.
Eles são mandados «como cordeiros para o meio de lobos» a anunciar o Reino e a sua paz: são inofensivos, dotados apenas da capacidade que lhes foi conferida por Jesus de tirar terreno à acção de Satanás, através de palavras e acções que alcançam a sua eficácia pela potencia do Senhor (cf. Lc 9,1). Como já no primeiro envio, Jesus traça algumas características que qualificam a missão e que se podem resumir na radicalidade necessária para testemunhar o Evangelho. O aspecto do enviado deve ser sinal de que aquilo que ele anuncia é vivido na primeira pessoa: tudo deve mostrar a pobreza e o sentido de urgência que invade a missão, porque o estilo daquele que anuncia o Evangelho é constitutivo do próprio anúncio! Pobreza e precariedade não são um obstáculo à eficácia da missão, mas são as condições para se viver em profundidade a fim de que a missão seja real: não basta ter poucos meios, é preciso ser pobre; não basta anunciar a paz, é preciso ser operadores dela. E se Cristo veio trazer a paz a todos os homens (cf. Ef 2,17), mesmo a quem não o acolheu, outro tanto deverão fazer os seus discípulos, sem invocar uma vingança do céu sobre quem os recusa (cf. Lc 9, 54)…
É a estes enviados, pobres e pacíficos, que Jesus diz: «Quem vos escuta, a mim escuta, quem vos despreza, a mim despreza». Eis a grande responsabilidade dos cristãos: como Jesus com a sua vida narrou o Pai (cf. Jo 1,18), agora toca a nós narrar Jesus, ser suas testemunhas no mundo (cf. Lc 24, 28). É verdade que a missão cristão outra coisa não é que a manifestação da sequela de Cristo por parte de quem acolhe o seu chamamento e o amam com todo o seu ser. Quem se entrega radicalmente a ele experimenta a sua protecção e escuta a sua voz que lhe assegura: «Nada te poderá fazer mal»… Mesmo diante do sucesso da missão, ao constatar que «os demónios se submeterão a ele no Nome de Cristo», o cristão reconhecerá que o que é devido essencialmente à intercessão do próprio Cristo: «eu vos dei o poder de vencer o Inimigo». E assim viverá a sua palavra: «Não vos alegreis porque os demónios se submetem a vós, alegrai-vos antes porque os vossos nomes estão inscritos no céu».
Sim, a nossa alegria consiste na protecção do Senhor, no facto de que ele, depois de nos ter chamado, não desiludirá as nossas esperanças, mas através de nós difundirá sobre a terra o seu Evangelho: só nos é pedido que sigamos Jesus Cristo para onde quer que ele vá (cf. Ap. 14,4), sabendo que podemos anunciá-lo aos outros homens somente se ele vive em nós.
Enzo Bianchi
Prior de Bose
trad: mro
6.7.07
Um novo dom para a Igreja de Braga: António Couto, Bispo Auxiliar
1. «O Senhor-Deus modelou o homem do pó do solo, e soprou nas suas narinas um alento de vida, e o homem tornou-se um ser vivo» (Génesis 2,7).
2. Descrição de sonho. Um Deus que modela com as suas mãos o homem da nossa terra pura e fecunda. O húmus, a humildade, o homem. Tecido de húmus, de humildade, modelado e embalado pelas mãos maternais de Deus. Acariciado, mimado, animado, pelo sopro puro de Deus: beijo de Deus no rosto do homem. Eis o homem.
3. Alguns Livros à frente, no final do Deuteronómio, continuamos a ler, para feliz espanto nosso, que «Moisés, servo de Deus, morreu ali, na terra de Moab, à boca de Deus» (Deuteronómio 34,5), depois de, no Livro dos Números (12,8), Deus ter já aparecido a declarar: «Falo com ele (Moisés) boca a boca».
4. Nenhuma distância. Tamanha intimidade. Tanto carinho. Quando nasce. Durante a vida toda. Também na morte. Note-se bem que o homem não é só pó. É pó modelado e soprado,/ beijado,/ sustentado pelo alento puro e amoroso de Deus. O homem é, portanto, pó e amor. E o amor não volta ao pó, pois «o amor é forte,/ é como a morte» (Cântico dos Cânticos 8,6), «liberta da morte» (Tobias 12,9; Provérbios 10,2; 11,4; Dn 4,24). Quem acolhe o amor de Deus não fica, pois, perdido nas páginas do pó (Jeremias 17,13), mas é recolhido pelas mãos carinhosas de Deus nas páginas do livro da vida (Salmo 87,5; Isaías 4,3; Daniel 12,1; Malaquias 3,16; Lucas 10,20; Apocalipse 20,12).
5. Contrasta absolutamente com o que vemos descrito nos mitos mesopotâmicos antigos, nomeadamente no Enuma Elish e no poema de Atra-hasis. Também aí os deuses modelam o homem a partir da terra. Mas não se trata de terra pura e fecunda, carregada de humildade. É, antes, terra amassada com o sangue e restos dos deuses maus, assassinados pelos deuses ditos bons. Como se pudessem ser bons os deuses violentos e assassinos! De qualquer modo, nesses textos mitológicos mesopotâmicos, o homem nasce tristemente de uma acção de limpeza que os deuses levaram a efeito no seu seio. É fruto, não de mãos de amor, mas de mãos assassinas e ensanguentadas, que, depois de varrerem o lixo do seu seio, o despejaram no homem, como se de um saco de lixo ou de um contentor se tratasse! Nenhum amor nestes deuses violentos, nenhum amor neste homem, que não é mais do que o caixote de lixo da divindade. Fruto da violência, mal feito, feito de mal, este homem é mau e mesquinho e violento por natureza, marionete nas mãos dos deuses violentos, vítima revoltada e violenta de deuses tirânicos e prepotentes. Sem liberdade e sem graça, sem humanidade, sem humildade, sem amor. Uma espécie de robot violento e metalizado, irresponsável, impassível, insensível, inculpável. In-culpável: o mal que o afecta é um mal natural; não é sequer mal moral, pois este supõe e requer a liberdade.
6. Ler o homem e ler o mundo, ler este homem e ler este mundo: gesto que não pode ser feito sem respeitar a intencionalidade do criador, que me deu a mim mesmo por amor, para que eu me receba por amor, e me deu o mundo por amor, para que eu o receba por amor. Ao contrário do que possamos pensar, receber não é um gesto fácil; é um gesto difícil que requer inteligência e coragem. Implica que eu compreenda que não tenho em mim o meu fundamento, que não tenho nenhum direito sobre mim nem sobre o mundo, que eu não sou meu e que o mundo não é meu, que eu não sou dono de mim nem dono do mundo, que não posso dar-lhes o sentido que eu quiser.
7. O sentido é o amor, que não volta ao pó. O amor liberta da morte, meu irmão de Novembro.
António Couto
30.6.07
Poema a um amigo na manhã do funeral
O orvalho da muita manha.
Corria de noite, como no meio da alegria,
pelo orvalho parado da noite.
Luzia no orvalho. Levava uma flecha
pelo orvalho dentro, como se estivesse a ser caçado
loucamente
por um caçador de que nada se sabia.
E era pelo orvalho dentro.
Brilhava.
Não havia animal que no seu pelo brilhasse
assim na morte,
batendo nas ervas extasiadas por uma morte
tão bela.
Porque as ervas têm pálpebras abertas
sobre estas imagens tremendamente puras.
Pelo orvalho dentro.
De dia. De noite.
A sua cara batia nas candeias.
Batia nas coisas gerais da manhã.
Havia um homem que ia admiravelmente perseguido.
Tomava alegria no pensamento
do orvalho. Corria.
Ouvi dizer que os mortos respiram com luzes transformadas.
Que têm os olhos cegos como sangue.
Este corria, assombrado.
Os mortos devem ser puros.
Ouvi dizer que respiram.
Correm pelo orvalho dentro, e depois
estendem-se. Ajudam os vivos.
São doces equivalências, luzes, ideias puras.
Vejo que a morte é como romper uma palavra e passar
— a morte é passar, como rompendo uma palavra,
através da porta,
para uma nova palavra. E vejo
o mesmo ritmo geral. Como morte e ressurreição
através das portas de outros corpos.
Como uma qualidade ardente de uma coisa para
outra coisa, como os dedos passam fogo
À criação inteira, e o pensamento
pára e escurece
—como no meio do orvalho o amor é total.
Havia um homem que ficou deitado
com uma flecha na fantasia.
A sua água era antiga. Estava
tão morto que vivia unicamente.
Dentro dele batiam as portas, e ele corria
pelas portas dentro, de dia, de noite.
Passava para todos os corpos.
Como em alegria, batia nos olhos das ervas
Que fixam
estas coisas puras.
Renascia.
Herberto Helder
XIIIII Domingo do Tempo Comum
Lc. 9, 51-62
Como seguir o Senhor Jesus, como caminhar «nas suas veredas» (cf. 1Ped 2,21)? Esta é a pergunta à qual o Evangelho de hoje responde.
O excerto abre com uma anotação importante: «Jesus endureceu o seu rosto para ir a Jerusalém». Inicia aqui a parte central do evangelho de Lucas, aquela na qual Jesus persegue o seu caminho para a cidade santa com extrema resolução, recolhendo todas as suas forças para fazer face às dificuldades que o esperam; ele sabe, com efeito, que «não é possível que um profeta morra fora de Jerusalém» (Lc 13,33). E não obstante o seu desejo de mostrar à cidade santa a via da paz, antes da paixão, não lhe ficará senão o pranto sobre ela, incapaz de reconhecer quem a visitava para lhe trazer a paz (cf. Lc 19, 41-44)…
Jesus envia antes de si alguns mensageiros encarregados de anunciar a sua passagem, mas estes, chegados a uma aldeia samaritana, são rejeitados por causa de uma antiga rivalidade religiosa entre judeus e samaritanos (cf. Jo 4,9). Nem sempre Jesus é acolhido com favor; aquilo que é certo, porém, é a sua vontade de não se vingar, de não reagir com violência ao insulto recebido. Mas esta não é a atitude espontânea dos seus discípulos que, representados por Tiago e João, os impetuosos «filhos do trovão» (Mc 3,17), queriam fazer descer um fogo do céu sobre quem os recusou. Eles podem apelar a um precedente ilustre: o profeta Elias tinha agido neste modo contra os seus adversários (cf. 2Rs 1,10.12). Não assim Jesus, que não quer opor hostilidade à hostilidade: ele vive radicalmente o amor pelo inimigo que ensina (cf. Lc 6,27-35), e assim mostra a quem o segue como não se deve nunca cair na terrível lógica da «reciprocidade»… O discípulo de Jesus Cristo é sempre e só chamado a fazer o bem, mesmo no confronto de quem o hostiliza.
Durante este caminho para Jerusalém dois «aspirantes discípulos» se propõem a Jesus, e um outro, chamado por ele, coloca-lhe condições preliminares. Atitudes inadequadas ao seguimento de Jesus, porque para assumir aquele caminho o que conta é escutar o chamamento de Jesus, acolhê-lo e obedecer-lhe, prontos a ir com ele mesmo onde não queremos, sem impedir as exigências que ele coloca: assim aconteceu, mesmo no meio de infidelidades e quedas, a quantos seguiram Jesus sobre a estrada da Galileia e da Judeia…
O primeiro individuo propõe-se dizendo, cheio de zelo: «Seguir-te-ei para onde quer que vás». Mas Jesus parece desencorajá-lo, insistindo sobre a sua condição itinerante, caracterizada pela precariedade própria de quem põe como metro último do seu agir apenas o Reino de Deus: «as raposas têm tocas e os pássaros do céu os seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça». Nenhuma presunção de si em quem quer seguir Jesus! Ao segundo é o próprio Jesus que dirige o seu chamamento, mas ouve responder: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai». Jesus porém não admite dilações e replica com uma palavra paradoxal: «Deixa que os mortos sepultem os mortos; tu vai e anuncia o Reino de Deus».
Ou, diante do chamamento não há sequer mais tempo para cumprir os deveres de piedade familiar (cf. Ex 20,12; Tb 4,3): é preciso dar o primado a Jesus, aqui e agora. Há, por fim, um terceiro que diz a Jesus: «Te seguirei, mas antes deixa que eu me despeça dos de casa». Elias tinha concedido isto a Eliseu (cf. 1Rs 19, 19-21), mas Jesus afirma: «Ninguém que meteu a mão ao arado e depois se vira para trás é digno para o Reino de Deus». A vida cristã é questão de resolução e de perseverança: resolução como necessária mobilização das energias para escolher e perseguir o objectivo, perseverança como fidelidade quotidiana até à morte. Devemos estar todos os dias «esquecidos do que está para trás e virados para o que está à frente» (fil 3,13), Jesus Cristo, que sempre nos precede no caminho para o Reino…
Jesus expôs com franqueza as exigências da sua sequela, válida para todos os cristãos. Como responder ao chamamento que nasce do seu amor por nós? Com o amor: amando Jesus acima de tudo, mais do que todo outro nosso amor (cf. Mt 10,37), e através dele os outros, mesmo os nossos inimigos. Mas para fazer isto é preciso considerar o Senhor Jesus como o tesouro precioso da nossa vida (cf. Mt 13,44) e considerar que vale a pena viver como ele viveu. De resto, ele disse-o claramente: «Quem quiser salvar a própria vida, há-de perdê-la; mas quem a perder por mim, salvar-se-á» (Lc 9,24).
Enzo Bianchi
Prior de Bose
[trad: mro]
6.6.07
CORPO E SANGUE DE CRISTO
LC 9, 11-17
Celebramos hoje a solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, memória dos gestos e das palavras de Jesus na última ceia, memória da eucaristia que reassume toda a sua existência, vida gasta e oferecida pelos irmãos até à morte. Este ano acedemos a tal mistério através da narração da multiplicação dos pães e dos peixes que prefigura o dom do pão da vida que Jesus fará com o seu gesto sobre o pão na vigília da sua paixão.
De regresso da missão «os apóstolos contaram a Jesus tudo o que fizeram» (Lc 9,10), e ele chama-os a retirar-se à parte, nos arredores de Betsaida, para ficarem a sós com ele e assim renovar a comunhão consigo: nesta intimidade com o seu Senhor e Mestre consiste a verdadeira possibilidade de retemperar-se oferecida por Jesus aos discípulos… Mas a multidão, vinda a saber desta fuga de improviso, mete-se no seu peugada: eles reclamam a presença de Jesus, a sua pessoa, porque com as suas palavras e as suas acções ele é o verdadeiro alimento capaz de saciar a fome de todo o homem. E eis que Jesus aceita fazer-se próximo de quantos têm necessidade: «acolhe a multidão, anuncia-lhes o Reino de Deus e cura quantos precisam de cura».
Rapidamente chega a noite e os Doze —conscientes da sua pobreza: «temos apenas cinco pães e dois peixes» — dirigem-se a Jesus pedindo-lhe que despeça as pessoas numerosas que o seguem a fim de que abandonando aquele lugar deserto possam dirigir-se às vilas mais próximas para encontrar alimento e alojamento. Mas o seu Mestre, que tinha recebido a multidão cumprindo tudo o que estava em seu poder para dar a eles a vida, não aceita o seu convite e solicita-lhes, com uma precisa ordem, como já tinha feito em outro tempo o profeta Eliseu (cf. 2Re 4,42-44): «Dai-lhes vós mesmos de comer». É uma ordem contra o bom senso, a razoabilidade, dado que os discípulos tinham manifestado a Jesus que a sua pobreza é um impedimento para realizar tudo quanto pede; mas Jesus exactamente naquela pobreza vislumbra o espaço necessário do dom, a condição na qual Deus pode mostrar a sua misericórdia e a sua bênção.
Jesus toma então com decisão a iniciativa e ordena que os cinquenta mil homens presentes se sentem por grupos de cinquenta (cf. Ex 18,24-26): «então ele tomou os cinco pães e os dois peixes e, levando os olhos ao céu, abençoou-o, partiu-o e deu-o aos discípulos para que os distribuíssem às multidões». É fundamental reconhecer a importância destes quatro verbos. São os mesmos utilizados para descrever a acção de Jesus na ultima ceia, quando ele tomou o pão, alimento necessário para a vida do homem; pronunciou sobre ele a bênção, deu graças a Deus, atestando de tal modo que o pão é fruto da terra e da bênção de Deus sobre o trabalho humano; partiu-o, com uma acção altamente expressiva, destinada a imprimir-se na mente dos discípulos (cf. Lc 24,35); deu-o aos seus comensais afirmando: «Tomai e comei, este é o meu corpo», a minha vida, isto é: «eu me dou a vós a fim de que vocês participem da minha própria vida» (cf. Lc 22,19). E é significativo que os dois discípulos de Emaús, mais tarde, reconheceram Jesus Ressuscitado exactamente quando ele cumprirá estas quatro acções (cf. Lc 24,30-31), sinal de uma vida gasta, entregue, repartida por amor aos homens.
«Todos comeram e ficaram saciados, e das partes que sobraram encheram doze cestos»: o nosso excerto conclui com esta anotação que testemunha a superabundância do dom de Jesus Cristo, oferecido a todos os homens. Jesus, portanto, é o profeta que faz sinais bem maiores que o Profeta Eliseu, e as doze cestas que sobraram —doze quantas as tribos de Israel— são o sinal daquela «medida boa, calcada, sacudida, transbordante» que será dada àqueles que sabem dar e partilhar (cf. Lc 6,38). Ele é verdadeiramente «o pão da vida» (Jo 6,35.48), é o Senhor que na eucaristia, sinal que sintetiza o sentido da sua inteira vida, nos comunica toda a sua existência: sim, o sacramento do Corpo e do Sangue de Jesus Cristo infunde em quem participa nele as energias para viver como ele sempre viveu. Isto deveremos recordar todas as vezes que celebramos a Eucaristia; e a partir desta verdade deveremos contemplar não só a narração da multiplicação dos pães, mas toda a vida de Jesus narrada pelos evangelhos, modelo e marca para a nossa existência quotidiana.
Enzo Bianchi
Prior de Bose
[trad: mro]
UM MODO FRÁGIL, INFINITO, DE FICAR
Durante três anos aqueles amigos percorreram as cidades do Oriente. Sempre juntos, pobres, generosos, caminhavam na força que têm as palavras e os gestos. À sua frente seguia alguém misterioso como o fogo, belo como o vento que bate nas árvores. Junto de Jesus, os dias eram um milagre. Mas Jesus sabe que tem de partir. Por isso encontrou um modo frágil, infinito, de ficar com os que ama: um pedaço de pão e um copo de vinho. «Este é o meu corpo. Este é o meu sangue. Eu estarei sempre convosco!»
Solenidade do Corpo e Sangue do Senhor
Numa igreja de Veneza encontrei uma pintura de Tintoretto sobre a Última Ceia. Mulheres e homens trabalham incessantemente na confusão habitual das festas de hoje. Mas a pintura parece uma celebração cósmica. Figuras de anjos sobrevoam a sala, leves, ágeis como o fogo. Os discípulos, desconcertados, olham atentos, para o centro da mesa. É aí que está Jesus, soberano, sereno. Ele oferece de beber ao discípulo. O realismo é tão grande que ainda hoje pareço ouvir dizer: «Isto é o meu sangue». O sangue que lava os pecados do mundo.
28.5.07
Formação do Clero: 29 Maio
(Arciprestados convocados: Celorico de Basto; Cabeceiras de Basto; Fafe; Guimarães e Vizela)
Ponto de Encontro: Balasar
(Arciprestados convocados: Barcelos; Esposende; Vila do Conde/Póvoa de Varzim; Famalicão)
Ponto de Encontro: Braga
(Arciprestados convocados: Braga, Vila Verde; Póvoa de Lanhoso; Vieira do Minho, Amares; Terras do Bouro)
A afectividade do sacerdote
Abade de Osera
Local: Balasar
9.30h
Formação Intelectual e Teológica
Uma introdução ao evangelista do ano: Lucas
Doutor António Couto
Local: Braga
9.30h
Formação Litúrgica e Pastoral
«A família»
Sr. Dom António Marcelino
Local: Guimarães
9.30h
26.5.07
O ESPÍRITO SANTO
Podemos imaginá-lo como um vento,um sopro, uma respiração, por vezes suave, pairando sobre as águas, por vezes vigoroso, rasgando o medo. Podemos imaginá-lo como um fogo, iluminando todas as espécies de noites ou purificando, ardentemente, um coração. Podemos imaginá-lo como uma pomba, inocente, ou um voo, majestoso, de águia. Podemos imaginá-lo como água, fonte pura ou torrente impetuosa das nossas sedes. Podemos senti-lo como um óleo, um perfume, uma unção que dá vida, esplendor e companhia na morte. Podemos imaginá-lo, por fim, como uma pessoa. A terceira pessoa da Santíssima Trindade. O Espírito Santo.
Solenidade do Pentecostes
Ano C
Jo 14, 15-16.23-26
A grande festa do Pentecostes constitui a plenitude do evento pascal: Jesus Ressuscitado, subido aos céus e partícipe da senhoria de Deus, cumpre a promessa feita aos seus discípulos de lhes enviar o Espírito santo. E é exactamente na potencia do Espírito que a comunidade cristã pode testemunhar Cristo no meio de todos os homens, «nas suas respectivas línguas» (cf. At 2, 4.8.11).
Se para o povo de Israel o Pentecostes era a festa memorial do dom da Lei do Sinai, a festa da aliança, para a comunidade de Jesus o dom do Espírito é celebração da aliança nova, ultima, definitiva. Jesus não deixou «órfã» (cf. Jo 14,18) a sua comunidade, nem a ascensão ao céu representou uma separação que colocasse um fim na sua acção no mundo. A comunidade dos crentes, de facto, partilha com ele a mesma vida, o mesmo Espírito, e este habilita-a a prosseguir a sua acção na história: anunciar a boa nova do Evangelho, realizar o bem, empenhar-se por fazer recuar o domínio de Satanás. Como Jesus foi revestido da força do Espírito santo e assim habilitado para a missão (cf. At 10, 38), também assim a sua igreja, a partir do dia de Pentecostes…
No excerto evangélico de hoje meditamos sobre esta realidade escutando a promessa do Espírito santo feita por Jesus aos discípulos durante os chamados «discursos do adeus», aqueles nos quais, como Senhor vivente e glorioso, fala ainda hoje a nós. Jesus liga estritamente tal promessa ao amor: «se me amais, observareis os meus mandamentos. Eu rezarei ao Pai por vós e ele vos dará um outro Consolador para que permaneça convosco para sempre». O cristão é tal somente na medida em que ama o Senhor Jesus Cristo «com todo o coração, com toda a mente, com todas as forças» (Dt 6,5; Mc 12,30), o ama mais que as pessoas mais caras (Mt 10,37), o ama mais que a sua própria vida (cf. Mt 10,39). É vivendo neste amor que ele pode fazer a experiencia do Espírito santo, Espírito Consolador, Paráclito, «chamado ao lado», que actualiza a presença de Jesus — o primeiro Consolador dos seus discípulos (cf. 1 Jo 2,1)— e o socorre na canseira quotidiana da perseverança; Espírito de verdade, que o «guia à verdade inteira» (Jo 16,13): e para o cristão a verdade não é uma noção abstracta, mas uma pessoa, Jesus Cristo (cf. Jo 14, 6)!
Depois de novamente ter insistido sobre o amor por ele e pela sua palavra como possibilidade para o crente de acolher em si o amor do Pai e de se tornar sua morada, Jesus assinala a sua promessa com uma revelação decisiva: «o Consolador, o Espírito santo que o Pai mandará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos recordará tudo o que eu vos disse». Ou: o Espírito santo, hoje, conduz os discípulos a perceber e a assumir em profundidade aquelas realidades que, enquanto Jesus estava fisicamente com eles, não eram ainda capazes de acolher. Há tempos diversos na compreensão de Jesus Cristo e do mistério da salvação; há gestos e palavras de Jesus não imediatamente compreendidos pelos discípulos, assim como há um não-dito do qual será o Espírito santo a fazer-se interprete, ele que «não falará de si, mas dirá tudo o que terá ouvido e anunciará as coisas futuras» (Jo 16,13). Sim, no coração dos crentes o Espírito age tornando presente toda a vida de Cristo, enquanto ouvinte assíduo do Filho: ele é memória total da pessoa de Cristo, e assim ilumina o nosso agir quotidiano, até ao dia da Vinda do Senhor na glória.
Compreende-se então porque é que Jesus afirmou: «Quando vier o Consolador que vos mandará o Pai, o Espírito de verdade que procede do Pai, ele dará testemunho de mim; e também vós dareis testemunho de mim» (Jo 15, 26-27). Nós cristãos somos testemunhas de Jesus Cristo entre os homens (cf. Lc 24, 48; At 1,8), somos o seu corpo no mundo: esta é a nossa responsabilidade, mas esta é também a nossa alegria mais profunda, que nada nem ninguém nos poderá roubar (cf. Jo 16, 23). Sim, porque como cristãos vivemos do amor e no amor: amamos Jesus Cristo e Jesus Cristo ama-nos. Nós e Cristo vivemos juntos!
Enzo Bianchi
Prior de Bose
(trad: mro]
19.5.07
ASCENSÃO DO SENHOR
Lc 24, 46-53
Nas leituras da solenidade da Ascensão escutamos duas vezes a narração do êxodo de Jesus deste mundo para o Pai feito por Lucas, nos Actos dos Apóstolos (ACT 1, 1-11) e no Evangelho.
Na verdade nos outros evangelhos não se fala deste «facto», porque ele está já contido no evento da ressurreição de Jesus, no seu êxodo da morte para a vida eterna, do túmulo para o Reino de Deus. A Ascensão de Jesus, este «separar-se dos discípulos», este «ser levado» pela potencia de Deus para o céu, este «subtrair-se ao olhar dos apóstolos» (cf. Act 1,9), é de facto uma nova narração do evento da ressurreição, como o são as diversas aparições - manifestações de Jesus às mulheres discípulas e aos doze: sim, nós estamos sempre a celebrar a Páscoa, que é vitória de Jesus sobre a morte, que é vida nova e eterna de Jesus, que é glorificação de Jesus, que é o entrar de Jesus, pela força do Espírito santo, na vida divina do Pai.
Se os vários textos evangélicos que falam da ressurreição de Jesus nos revelam o significado deste evento em diversas perspectivas, os excertos hodiernos metem em evidencia que a «assunção» de Jesus ao céu significa também «separação» dos seus, «ausência» desta terra: ele não pode mais ser visto nem na carne nem na sua forma gloriosa…Tal separação anuncia, porém, uma nova forma de presença de Jesus junto da comunidade, de tal modo que os crentes nele nunca ficarão sós, «órfãos» (Jo 14,18): por isso ao subir ao céu Jesus abençoa os discípulos. No inicio do evangelho segundo Lucas a bênção de Deus que deveria ser realizada pelo sacerdote Zacarias à saída do santuário tinha sido, por assim dizer, suspensa (cf. Lc 1,21-22); mas agora eis que Jesus a retoma e a leva a cumprimento: é a bênção prometida e dada a Abraão, reconfirmada a Israel, e agora oferecida por Jesus glorioso à Igreja para que ela a leve «até aos confins do mundo» (At 1,8) e assim sejam abençoadas todas as gentes da terra (cf. Gn 12,3; 18,18,etc).
No ascender ao Pai, Jesus promete também o Espírito Santo, que com a sua força tornará os crentes testemunhas, isto é, pessoas capazes de contar que Jesus veio ao mundo como homem e passou entre os homens fazendo o bem (cf. At 10, 38), pessoas capazes de o esperar como aquele que virá na glória. De facto, do mesmo modo como os discípulos o viram subir ao Céu, o verão quando no ultimo dia regressar na glória! Enfim, enquanto termina a forma de uma história, inicia «uma outra forma» (Mc 16,12) da mesma história: numa e noutra Jesus é a narração definitiva de Deus feito homem para nós, é o rosto do Deus vivente (Jo 1,18)…
Também a nós, aqui e agora, está reservada a pergunta dos anjos: «porque estais a olhar para o céu?» (At 1,11). Preste-se atenção: este não é um convite a olhar apenas as coisas da terra, mas um aviso a não procurar mais aquela presença física de Jesus do qual os discípulos tinham feito experiencia na história. Não, Jesus não deve ser procurado junto do tumulo vazio, nem levantando os olhos para o alto para chorar por uma aparição: ele deve agora ser procurado na comunidade cristã, na eucaristia, nos homens e mulheres que, na condição dos últimos, esperam de nós «o serviço ao irmão» no qual Jesus quis tornar-se presente (cf Mt 25, 31-46). É assim que podemos viver a nossa função de cristãos: levar a bênção, «começando por Jerusalém e até aos confins do mundo», anunciando a conversão e a remissão dos pecados, e tudo isto na potencia do Espírito Santo.
Como os doze depois da ascensão de Jesus estavam cheios de alegria, também nós hoje devemos estar em festa, por compreendermos em profundidade o que Jesus afirmou no quarto evangelho: «É do vosso interesse que eu vá, porque assim não só estarei sempre convosco, mas estarei de modo ainda mais pleno: o meu respiro, o Espírito Santo, será o vosso respiro, porque eu o enviarei a vós como dom que vos acompanhará sempre (Jo 14, 16; 16, 7)!
Enzo Bianchi
Prior de Bose
[trad: mro]