O Bom Pastor:

Formação do Clero da Arquidiocese de Braga

21.6.06

Simpósio dos Presbíteros em Fátima: o que é o Presbitério?

«Chorava José, no Egipto,
por seu pai, que era Jacó;
eu também choro e grito,
por me ver no mundo, só».

Assim cantavam os ceguinhos, há mais de meio século, nas romarias populares do coração das Beiras, na minha longínqua infância. Jamais se me sumiu na memória a interessante quadra, pois traduzia uma realidade, de que cedo me apercebi: nós nascemos para viver e actuar em sociedade ou grupo. Por isso, sofremos com a solidão.
A primeira sociedade que o homem encontra e o acarinha, logo ao nascer, é a família, na qual viu o seu primeiro dia luminoso, após nove meses na escuridão aconchegada do seio materno.
Seguem-se inúmeras outras em que se vê inserido, por circunstâncias alheias à sua vontade, ou por opção própria: a aldeia ou bairro, a escola, o grupo ou clube desportivo, a fábrica e a profissão, o partido político, o município, a nação e tantas mais.
Também na vertente religiosa depara com a mais variada modalidade de associações: a catequese e o grupo de acólitos ou coral, a paróquia e a diocese, os diversificados agrupamentos e movimentos.
Aqueles que optaram pelo serviço ministerial do povo de Deus, pela recepção do sacramento da Ordem, entram automaticamente num grupo bem caracterizado, estável e de incomparável coesão -- o Presbitério --, formado pelo conjunto dos presbíteros: genericamente de todo o mundo, particularmente de uma circunscrita área da Igreja Católica.
Mas, quem são os presbíteros?
O Decreto conciliar sobre o Ministério e vida dos sacerdotes -- aprovado em 7 de Dezembro de 1965, véspera do encerramento do Vaticano II, com 2.390 votos positivos e quatro negativos -- afirma no Proémio que «os presbíteros, em virtude da sagrada ordenação e da missão que receberam das mãos dos bispos, são promovidos no serviço de Cristo mestre, sacerdote e rei, de cujo ministério participam, mediante o qual a Igreja continuamente é edificada em povo de Deus, corpo de Cristo e templo do Espírito Santo». Logo a seguir, acentua que «o sacerdócio dos presbíteros (...) é conferido mediante um sacramento especial, em virtude do qual ficam assinalados com um carácter particular e, dessa maneira, configurados a Cristo sacerdote, de tal modo que possam agir em nome de Cristo cabeça. Participando, a seu modo, do múnus dos Apóstolos, os presbíteros recebem de Deus a graça de serem ministros de Jesus Cristo no meio do povo, desempenhando o sagrado ministério do Evangelho, para que seja aceite a oblação dos mesmos povos, santificada no Espírito Santo».
O actual Código de Direito Canónico recomenda que os candidatos ao sacerdócio «se preparem para a união fraterna com o presbitério diocesano, de que serão participantes no serviço da Igreja» (c. 245, 2).
Embora cada presbítero desempenhe uma missão específica na Igreja, ele encontra-se associado aos seus colegas e com eles solidário no serviço do povo de Deus; e isto, quer tenha sido ordenado em ligação imediata com uma diocese, quer inserido num instituto religioso; ou seja, pertencente ao clero diocesano ou congregacionista.
São actualmente mais de 400.000 os presbíteros ao serviço da Igreja em todo o mundo católico: exactamente 3.029 seculares e 1.076 religiosos, há dois anos. Distribuem-se por cerca de 220.000 paróquias, agrupadas em 3.000 dioceses, ou diferentes circunscrições eclesiásticas, equiparadas a umas e outras.
Em Portugal são um pouco mais de 4.000 os presbíteros -- seculares e religiosos --, ajudados por 150 diáconos permanentes, distribuídos por 21 dioceses (incluída a das Forças Armadas, de índole pessoal, inserida em todo o território nacional).
Em cada diocese, o conjunto dos presbíteros forma o presbitério diocesano -- que, em sentido amplo, abarca também os sacerdotes religiosos, com serviço estável na área daquela -- mas congregado em vários agrupamentos subalternos, como os arciprestados (ou ouvidorias) e as regiões pastorais. Em tempos antigos, houve os arcediagados, correspondentes de algum modo às actuais vigararias regionais (onde existem), sendo os vigários episcopais desta índole continuadores dos clássicos arcediagos.
Mais perto do bispo, para o servir na liturgia da Sé e aconselhar na organização da diocese e, de modo especial, sede vacante, surgiu o cabido da catedral, constituído pelos cónegos, tendo à frente o deão. Nas dioceses onde aquele não existe, ou não exerce as segundas funções, tem de se constituir um corpo de consultores, para este último serviço, competindo-lhe, em tal hipótese, eleger um administrador diocesano, o que tradicionalmente era atributo do cabido e continua a ser, onde tal for decidido.
Mas o principal agrupamento de presbíteros é actualmente o denominado conselho presbiteral -- de índole consultiva, como o nome indica --, a ser ouvido com periodicidade estatutária, ou de modo extraordinário, pelo bispo diocesano. Ele deve ser representativo de todo o presbitério da diocese (secular e religioso) com membros eleitos pelas bases, ou em razão dos cargos desempenhados e eventualmente alguns, embora em número reduzido, por escolha do bispo, tendo em conta qualidades específicas ou situações não devidamente representadas. Constituem uma percentagem do total do presbitério, inversamente proporcional ao número de elementos que o integram (vide cânones 495-502).
Permito-me terminar com uma alusão à minha experiência pessoal, pois sempre trabalhei com este órgão de assessoramento e aconselhamento, nos 35 anos em que desempenhei o serviço pastoral de bispo diocesano (1964-1999): oito em Moçambique, cinco em Angola e quase 22 em Portugal. Em Vila Cabral, o Conselho de presbíteros era constituído pela totalidade do clero (15 elementos, ou seja, 100%), em Sá da Bandeira, por 30% (30, em 90) e em Braga, por menos de 10% (45, em mais de 500); isto em números globais, mas bastante aproximados e reveladores.
Reunia invariavelmente com ele, duas vezes por ano, com grande ajuda para mim e creio que sem desapontamento para a instituição.

D. Eurico Dias Nogueira
Arcebispo Emérito de Braga