II Domingo da Páscoa
Nesta oitava da Páscoa celebramos o «domingo de Tomé», o discípulo ausente na primeira aparição de Jesus ressuscitado e que permaneceu incrédulo diante do testemunho dos seus irmãos. Quando, porém, o Ressuscitado se manifesta pela segunda vez ele está presente e crê plenamente, aderindo com todo o seu ser ao Senhor da sua vida.
Na sua vicissitude Tomé resume bem o difícil itinerário realizado pelos primeiros discípulos para chegar à fé pascal: esta não é fruto de uma exaltação religiosa ou de uma alucinação psicológica, mas é uma vitória profunda de Jesus ressuscitado sobre as dúvidas e os medos que paralisam os seus discípulos! É neste sentido que o evangelho de hoje nos indica um caminho para chegar a acreditar no Ressuscitado, aquele que sempre vem e fica entre nós, oferecendo-nos a sua paz e dando-nos o Espírito Santo; e isto, em particular, quando estamos reunidos na assembleia eucarística dominical, tempo e espaço no qual se tem a máxima epifania da comunidade cristã.
Nos dias que se seguem à morte de Jesus, os discípulos encontram-se em casa, fechados sobre si mesmos, não só «por medo aos judeus», mas também porque tornados escravos pelo medo da morte (cf. Heb. 2,15); e, no entanto, são habitados por uma inexprimível esperança, suscitada pelo anúncio de Maria de Magdala: «Vi o Senhor!»… Jesus toma a iniciativa e se manifesta pondo-se «no meio deles», qual Senhor que vem; ele infunde nos seus corações a paz, enquanto lhes mostra os sinais da sua paixão. Jesus está vivo, mas o seu sofrimento até à morte não pode ser apagado, e por isso as marcas da paixão permanecem indeléveis no seu «corpo espiritual» (1 Cor 15,44.46), transfigurado pela ressurreição. Soprando depois sobre os discípulos, num gesto que os recria (cf. Gen 2,7) e os faz passar da morte à vida (cf. ez 37,9), o Ressuscitado comunica-lhes o Espírito Santo. Deste modo habilita-os à única missão essencial: perdoar os pecados, perdoar em nome de Deus todos os homens. Sim, a Igreja testemunha a ressurreição de Jesus anunciando e actuando entre os homens a remissão dos pecados!
«Oito dias depois», portanto no mesmo dia de domingo, o dia do Senhor, Jesus manifesta-se de novo aos discípulos. Desta vez está presente também Tomé, novamente unido à comunidade regenerada pelo Espírito do Ressuscitado e capaz de anunciar a ressurreição; mas é exactamente a este anúncio que ele se tinha recusado acreditar, contrapondo a sua necessidade de provas certas: «se não vir nas suas mãos o sinal dos pregos e se não meter o dedo no lugar dos pregos e não meter a minha mão no seu costado, não acreditarei». Tomé não confia nos seus irmãos, pretende ter uma relação directa com o Senhor; e eis que o próprio Senhor com infinita paciência aproxima-se dele e o convida a contemplar os sinais da morte: «Mete aqui o teu dedo e olha as minhas mãos; estende a tua mão e mete-a no meu lado, e não sejas incrédulo mas crente». Então o discípulo chega finalmente a compreender e exclama: «Meu Senhor e meu Deus!», numa confissão de fé que não tem comparação em todo o Novo Testamento…
É difícil chegar à fé na ressurreição, para nós como para Tomé. Ele não teve necessidade de «meter o dedo», e no entanto teve de ver com os seus olhos; mas é graças a ele que Jesus pronuncia a sua última bem aventurança: «Felizes os que embora não vendo acreditarão!». Os destinatários destas palavras somos nós os leitores do evangelho, aquele «sinal escrito» capaz de suscitar a fé que conduz a «viver no Nome de Jesus», na salvação. Somos, portanto, chamados a experimentar a bem aventurança de quem vê Jesus com os olhos da comunidade cristã, reunida no dia do Senhor e na escuta da Palavra de Deus contida nas Escrituras Santas: de facto a comunidade e as Escrituras actualizam para nós a acção do Espírito Santo, enquanto são vivificadas por Ele. A comunidade e as escrituras interagem com o Espírito, criando uma circulação de vida que está no coração da liturgia eucarística: o Espírito vivifica a igreja tornando-a corpo de Cristo, e ressuscita as páginas de todas as Escrituras tornando-a Palavra vivente de Deus, testemunha do Senhor ressuscitado.
Enzo Bianchi
Prior de Bose
[trad: MRO]
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