O Bom Pastor:

Formação do Clero da Arquidiocese de Braga

20.1.07

III Domingo do Tempo Comum

(Rafael, Profeta Isaías, Igreja de Santo Agostinho, Roma)

III DOMINGO DO TEMPO COMUM
ANO C

Lc 1, 1-4; 4, 14-21


O Evangelho deste Domingo é composto por dois excertos: o prólogo, isto é o inicio do livro redigido por Lucas, e o inicio da pregação de Jesus. Colocados um ao lado do outro estes dois textos fazem-nos compreender como a Palavra de Deus se tenha tornado primeiramente Escritura, Bíblia, Livro Santo e depois, em cada época -— e portanto também para nós hoje— Palavra vivente para a assembleia dos crentes.

Iniciando o seu livro, Lucas dirige-se ao leitor cristão, «amante de Deus» —este é o sentido do nome de Teófilo— e lhe declara a sua intenção: assim como antes dele foi contada a história de Jesus, e o fizeram depois de ter ouvido o testemunho sobre este homem por aqueles que tinham sido cúmplices na sua vida, daqueles que o tinham conhecido, escutado e visto até se tornarem «servos da Palavra», também ele «depois de uma investigação acurada» decidiu escrever uma narração, isto é o Evangelho.

Sim, o Evangelho é um conto escrito sobre aquilo que Jesus fez e disse; ou melhor, é um contar a narração que Jesus com toda a sua vida fez de Deus. Eis porque nestes breves versículos iniciais se diz muito, nos vem exposto o essencial da nossa fé: «a Deus nunca ninguém o viu, mas Jesus que é o Filho enviado por Ele, contou-nos acerca Dele» 8cf. Jo 1, 18); e que, foi associado à sua vida, ou seja, quem o viu, escutou e tocou, por sua vez nos contou acerca de Jesus (1 Jo 1, 1-3), que depois alguns homens, os evangelistas, puseram por escrito. Mas isto é o que acontece desde sempre no seio da comunidade dos crentes em Deus, no Antigo e no Novo Testamento, e é o que acontece ainda hoje na igreja…

Um exemplo de tal processo é-nos dado pela segunda parte do excerto de hoje, tirado do quarto capítulo do Evangelho. È-nos narrado a vida dos crentes hebreus no tempo de Jesus: mesma na perdida aldeia de Nazaré no dia de Sábado eles se reuniam na sinagoga para escutar a Palavra de Deus contida na Lei e nos Profetas, livros escritos no passado, qual testemunho de como Deus falou ao seu povo. E eis que Jesus, depois de alguns anos de ausência, regressa á sua aldeia donde é natural, Nazaré, e participa na liturgia da Sinagoga: escuta um texto da Torah, participa no canto responsorial de alguns salmos, depois toca a ele ler a segunda leitura. Recebido o rolo dos Profetas, abre-o e lê o texto previsto para aquele dia, uma passagem do profeta Isaías no qual um profeta anónimo conta a própria vocação: o Espírito de Deus desceu sobre ele e pôs a sua morada nele; com a força que lhe foi dada pelo Espírito este profeta e servo do Senhor foi enviado a levar a boa nova aos pobres, a proclamar a libertação a todos os oprimidos, a pregar o ano da misericórdia do Senhor (Is 61, 1-2).

Lido o texto, cabe a Jesus dar a explicação, e ele o faz através de uma «homilia» que resume em poucas palavras: «hoje se cumpriu esta Escritura». Ou: o profeta apresentado por Isaías é o próprio Jesus, a Palavra de Deus testemunhada pelo antigo profeta e escutada por quantos se encontram na sinagoga se realiza exactamente nele! Isto significa que aquela página bíblica constitui o programa da missão de Jesus: eis o que ele fará e dirá, eis a boa noticia, o Evangelho que através dele se realiza… E assim a palavra revelada por Isaías, por ele escrita até tornar-se livro entre os livros da Bíblia, lida na liturgia celebrada em Nazaré, ressoa como Palavra de Deus cumprida em Jesus. Lucas narra pois este acontecimento no evangelho que, lido hoje na assembleia cristã, ressoa como Palavra que pede para ser realizada por cada cristão e por toda a Igreja.

Mas temos nós consciência, aqui e agora, que quando a Palavra de Deus contida na Escritura é proclamada, somos nós, ouvintes, que a devemos realizar? Sabemos que cabe a nós transmitir com a nossa vida a narração de Deus que nos foi dada por Jesus?

Enzo Bianchi
Prior de Bose

(tradução de Mário Rui de Oliveira)

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